Onde é que há gente no mundo?

Poema em Linha Reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó principes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Álvaro de Campos

Um contributo precioso para a história das ideias

Simplesmente fantástico, este projecto acabadinho de sair dos fervilhantes Google Labs. Com a ajuda de gráficos simples e claros e uma imensa base de dados de cinco milhões de livros (alojados no Google Books), temos um vislumbre da ascensão e declínio de conceitos e palavras ao longo dos últimos quinhentos anos da história humana. É explorar, meus amigos, é explorar: Google Ngram Viewer

 Neste gráfico fica patente, por exemplo, a partir de que momento na história o mundo de língua inglesa (isto é, o resto do mundo) começou a dar mais importância ao Brasil do que a Portugal.

Wikileaks e jornalismo

Será a Wikileaks jornalismo? Penso que não. Estrela Serrano também. Um artigo a ler: «(...) O WikiLeaks não é jornalismo. Desde logo, porque os seus responsáveis não têm acesso às fontes primárias da informação que divulgam, não podendo cruzá-la, fazer o contraditório, investigar, editar. O WikiLeaks publica informação “em bruto”, tal como lhe chega, limita-se a ser um depósito de materiais que outros consideram de interesse para os fins que perseguem.(...)»: Um mundo ao “estilo Assange” | VAI E VEM

O Génio

Ouvido agora mesmo na TV. Uma jovem pé de microfone da RTP apanha o Manoel de Oliveira no lançamento da última curta-metragem do mito e pergunta à queima-roupa: «O que é que espera deste século?». O vetusto senhor hesita e responde: «O que é que espero deste século?... Espero... Sei que não chegarei ao fim dele». Fim.

Mais uma que não vai para a biografia póstuma.

A racionalidade do cristianismo. Um debate

Podcast aqui: Reasonable Doubts: RD Extra: Is Christianity Rational?

Teologia

“[t]he study of theology, as it stands in Christian churches, is the study of nothing; it is founded on nothing; it rests on no principles; it proceeds by no authorities; it has no data; it can demonstrate nothing; and it admits of no conclusion. Not anything can be studied as a science, without our being in possession of the principles upon which it is founded; and as this is the case with Christian theology, it is therefore the study of nothing”, Thomas Paine

Isso

«estavam mais do que 7.000 pessoas para receber o Papa, e quem procurava protestar era reprimido. E quando os paises atrasados so Sul da Europa lançam planos de austeridade que põem na miséria largas faixas da população, o governo "socialista" espanhol, que governa um Estado nominalmente laico, paga 4 milhões de euros retirados do erário público para financiar a visita por 2 dias do chefe do Estado religioso do Vaticano - se o desejo da existência de Estados confessionais (multinacionais da Fé como o Vaticano) se verificar por vontade de determinadas faixas de cidadãos, pois que sejam esses crentes, e apenas esses, a pagar as despesas dos espectáculos folclóricos dos seus ídolos.», comentário do leitor Mordaquikesaileite algures no Expresso online

A propósito de

cadáveres esquisitos

Tandem Story
This assignment was actually turned in by two of my English students:

Rebecca ... and Gary ...
English 44A, SMU
Creative Writing
Professor Miller In-class Assignment for Wednesday:

One of you will then write the first paragraph of a short story. The partner will read the first paragraph and then add another paragraph to the story. The first person will then add a third paragraph, and so on back and forth. Remember to reread what has been written each time in order to keep the story coherent. The story is over when both agree a conclusion has been reached.

At first, Laurie couldn't decide which kind of tea she wanted. The chamomile, which used to be her favorite for lazy evenings at home, now reminded her too much of Carl, who once said, in happier times, that he liked chamomile. But she felt she must now, at all costs, keep her mind off Carl. His possessiveness was suffocating, and if she thought about him too much her asthma started acting up again. So chamomile was out of the question.

Meanwhile, Advance Sergeant Carl Harris, leader of the attack squadron now in orbit over Skylon 4, had more important things to think about than the neuroses of an air-headed asthmatic bimbo named Laurie with whom he had spent one sweaty night over a year ago. "A.S. Harris to Geostation 17," he said into his transgalactic communicator. "Polar orbit established. No sign of resistance so far..." But before he could sign off a bluish partical beam flashed out of nowhere and blasted a hole through his ship's cargo bay. The jolt from the direct hit sent him flying out of his seat and across the cockpit.

He bumped his head and died almost immediately, but not before he felt one last pang of regret for psychically brutalizing the one woman who had ever had feelings for him. Soon afterwards, Earth stopped its pointless hostilities towards the peaceful farmers of Skylon 4. "Congress Passes Law Permanently Abolishing War and Space Travel." Laurie read in her newspaper one morning. The news simultaneously excited her and bored her. She stared out the window, dreaming of her youth - when the days had passed unhurriedly and carefree, with no newspapers to read, no television to distract her from her sense of innocent wonder at all the beautiful things around her. "Why must one lose one's innocence to become a woman?" she pondered wistfully.

Little did she know, but she has less than 10 seconds to live. Thousands of miles above the city, the Anu'udrian mothership launched the first of its lithium fusion missiles. The dim-witted wimpy peaceniks who pushed the Unilateral Aerospace Disarmament Treaty through Congress had left Earth a defenseless target for the hostile alien empires who were determined to destroy the human race. Within two hours after the passage of the treaty the Anu'udrian ships were on course for Earth, carrying enough firepower to pulverize the entire planet. With no one to stop them, they swiftly initiated their diabolical plan. The lithium fusion missile entered the atmosphere unimpeded. The President, in his top-secret submarine headquarters on the ocean floor off the coast of Guam, felt the inconceivably massive explosion which vaporized Laurie and 85 million other Americans. The President slammed his fist on the conference table. "We can't allow this! I'm going to veto that treaty! Let's blow 'em out of the sky!"

This is absurd. I refuse to continue this mockery of literature. My writing partner is a violent, chauvinistic, semi-literate adolescent.

Yeah? Well, you're a self-centered tedious neurotic whose attempts at writing are the literary equivalent of Valium.

Asshole.

Bitch.


ps: encontrado na web em parte incerta.

Um cadáver esquisito

Com algum pudor relativamente ao termo projecto literário, que isto da literatura é assunto demasiado sério para vulgarizações, não encontro por ora melhor designação para o que foi iniciado neste blog há cerca de um mês atrás. Este projecto proto-literário, dizia eu, pretende contar uma história a quatro mãos e duas cabeças: A minha e a da Isabel, basicamente duas pessoas apaixonadas pela leitura e pela escrita que decidiram contar uma história por intermédio de um blogue. Nenhum de nós é escritor, no sentido literário da questão (porque isto de se ser escritor é um assunto demasiado sério para vulgarizações), mas pusemos mãos à obra e deixámos voar o pássaro. Chamámos-lhe Da Natureza do Cadáver. Um título completamente em aberto para uma história completamente em aberto. O ritmo de escrita e publicação de posts, a que poderemos chamar capítulos, é também livre, pretendendo-se no entanto manter uma frequência regular de actualizações. Começou na Alemanha e já vai na Austrália. Quem quiser receber os fascículos na caixa do correio ou no facebook, pode ir ao fundo da página inscrever-se. O cadáver está aqui.

Ciência e religião. Mais uma achega importante.

«(...) As a scientist and a former believer, I see this as bunk. Science and faith are fundamentally incompatible, and for precisely the same reason that irrationality and rationality are incompatible. They are different forms of inquiry, with only one, science, equipped to find real truth. And while they may have a dialogue, it's not a constructive one. Science helps religion only by disproving its claims, while religion has nothing to add to science.(...)»

Column: Science and religion aren't friends - USATODAY.com

Sem título

Uma reflexão sobre a amizade hoje

«(...)Será isto «amizade»? Ou apenas, nesta sociedade atomizada, com as referências vindo e partindo em perpétuo movimento, «uma tentativa de encontrar um sentimento de pertença a um colectivo», como escreve a socióloga Stéphane Hugon? Assistimos ali à construção de relações de proximidade que partem do colectivo para o indivíduo e não o contrário? Pode ser esta a chave para entender a mudança? Se for assim, não será mau de todo. Basta adaptarmo-nos. E ir aproveitando os restos do mundo arcaico feito de afectos conquistados com a epiderme.(...)»

A Terceira Noite » Seinfeld e o Facebook

Um universo do nada

Da literatura

«(...) Uma pessoa que não lê, ou que lê pouco, ou que lê apenas porcarias, pode falar muito, mas dirá sempre poucas coisas, porque para se exprimir dispõe de um repertório reduzido e inadequado de vocábulos. Não se trata apenas de um limite verbal; é, a um só tempo, um limite intelectual e de horizonte imaginário, uma indigência de pensamentos e de conhecimentos, porque as ideias, os conceitos, mediante os quais nos apropriamos da realidade e dos segredos da nossa condição, não existem dissociados das palavras, por meio das quais as reconhece e define a consciência. Aprende-se a falar com precisão, com profundidade, com rigor e agudeza, graças à boa literatura, e apenas graças a ela.(...)»

Mario Vargas Llosa in "Em Defesa do Romance". Integralmente aqui ou aqui

Despesas militares comparadas

Um gráfico extraordinário, que ajuda a colocar as coisas na sua devida perspectiva. No top 50 dos países que mais gastam dinheiro com a tropa, por relação ao seu orçamento nacional, a maioria é do chamado "terceiro mundo", e sobretudo do chamado mundo árabe, nações que certamente deveriam ter outras prioridades (só falta dizerem que a culpa é de quem vende...) de investimento, sendo que os EUA ficam em 28º: Orçamento militar - porcentagem do PIB - Comparação entre Países

A última década e o lado cheio da garrafa

Na Foreign Policy. Uma excelente análise da primeira década do século XXI, aparentemente trágica para os adeptos da narrativa apocalíptica. Uma janela sobre balanços que não fazem manchetes:

«The past 10 years have gotten a bad rap as the "Naughty Aughties" -- and deservedly so, it seems, for a decade that began with 9/11 and the Enron scandal and closed with the global financial crisis and the Haiti earthquake. In between, we witnessed the Asian tsunami and Hurricane Katrina, SARS and swine flu, not to mention vicious fighting in Sudan and Congo, Afghanistan and, oh yes, Iraq. Given that our brains seem hard-wired to remember singular tragedy over incremental success, it's a hard sell to convince anyone that the past 10 years are worthy of praise.

But these horrific events, though mortal and economic catastrophes for many millions, don't sum up the decade as experienced by most of the planet's 6-billion-plus people. For all its problems, the first 10 years of the 21st century were in fact humanity's finest, a time when more people lived better, longer, more peaceful, and more prosperous lives than ever before.»

Opening Gambit: Best. Decade. Ever. - By Charles Kenny | Foreign Policy

Ray Bradbury. 90 anos.


«The things that you do, should be things that you love, and the things that you love should be things that you do».

Ciência em rede

Excelentes notícias na frente de batalha do Alzheimer. Mas o facto de trazer para aqui este artigo deve-se mais às circunstâncias que rodeiam a notícia. A cultura da rede, tantas vezes atacada pelos pessimistas da modernidade, que se apoia por um lado nas noções de liberdade de informação e por outro no princípio da partilha, também tem tido um impacto extraordinário no desenvolvimento científico. Esta notícia mostra um futuro em que nunca tantos recursos e conhecimento se mobilizaram em cooperação para resolver alguns dos mais graves problemas da humanidade. A área da saúde não é exemplo único, mas é paradigmático: Rare Sharing of Data Led to Results on Alzheimer’s - NYTimes.com

Navegar é preciso

No subterrâneos da web, altas movimentações se agigantam. E colocam em risco este modelo livre de internet que temos tido há cerca de duas décadas. Esperemos que o futuro não seja isto. A propósito de um acordo entre a Google e a Verizon:

«(...) A leitura da proposta é estarrecedora. Basicamente, quando ela for aprovada as redes wireless passam a ter os conteúdos que cada operador decidir vender e o consumidor e os agentes do mercado perdem poder e voz, manietados por leis que colocam nas mãos da pequena parcela de empresas que controlarem o mercado não apenas a decisão do que é ou não é conteúdo público como a capacidade de julgar quem discorde. (...)»

Adeus neutralidade, olá "auto-estradas da informação" - Ondas na Rede - Comunidade Correio da Manhã

Como podemos pensar

Saindo de seis anos de uma segunda guerra mundial, a comunidade científica, até aí, como todos os outros sectores da sociedade, empenhada no esforço de guerra, procura novos caminhos, novos desafios e novas "causas". É este o contexto deste ensaio de Vannevar Bush, publicado em 1945: As We May Think - Magazine - The Atlantic

A Democracia sem tabús

Quatro excelentes prosas para um debate sobre a natureza dos regimes democráticos, de base parlamentar, e possíveis alternativas:

A internet está a mudar a nossa forma de pensar

«(...) To the specific question that Mr Carr asks about what the internet is doing to our brains, the simple answer is that it is making us think and behave differently. Of that, there is no doubt. But that does not mean we are getting dumber in the process. What makes people intelligent is their ability to learn and reason—in short, to adapt and thrive within their environment. That fundamental capacity has not changed in thousands of years, and is unlikely to do so because some new technology comes along, whether television, mobile phones or the internet.

Adaptation to one’s changing surroundings is a different matter. Every new medium introduced since the invention of the printing press has molded our minds in different ways. It would be alarming if it didn’t. Today, confronted with the ubiquity of the internet, we need a whole new set of skills to navigate the information-laden environment we inhabit. In other words, each new set of skills we learn and memories we create builds on our existing mental capacities without changing them in any fundamental way.

Still, the Jeremiahs have a point. Their concern is that prolonged use of the internet—with its smorgasbord of tantalising titbits of information—is producing a generation of magpie minds, as users hop from one bright trinket to another, rarely focussing long enough on any one topic to comprehend it thoroughly. According to this view of the brain, the lack of “deep thinking” lies at the heart of the present generation’s inability to sweat the hard stuff. Google, with its instant access to factoids of dubious veracity, is singled out as a primary source of the malaise.(...)»


The internet is changing the way you think: The Difference Engine: Rewiring the brain | The Economist

Mapa animado impressionante: As explosões nucleares de 1945 a 1998

O Facebook e as relações humanas

De como as redes sociais digitais influenciam o nosso comportamento social, ou abrem novas vias para velhas tendências. Algumas tão antigas como a espécie humana. Como afirma um dos entrevistados, Nelson Zagalo (que faz aqui uma excelente introdução ao tema), “A razão disto (da facilidade com que se fazem e desfazem novos amigos na web) prende-se com a necessidade fundamental que temos de viver em grupo e de ter companhia. Como tal todas as possibilidades que se abrem à hipótese de construção de relações com o outro são aproveitadas. A parte benéfica das redes sociais é que aqui o contacto social possui uma rede de segurança que é a distância física e o assincronismo”. Uma reportagem muito curiosa da Outlook: d_econo_facebook_3.7.2010.pdf (objeto application/pdf)

Da ética

«(...) Se Deus não existe, o que será da ética? Desde o século XVII que esta tem sido uma das questões centrais da filosofia. Na idade moderna, houve um relativo consenso de que a ética deve ser entendida como fenómeno humano — produto das necessidades, interesses e desejos do homem — e nada mais.

Thomas Hobbes (1588–1679) foi o primeiro pensador moderno importante a fornecer uma fundamentação secular e naturalista para a ética. Hobbes, que ganhava a vida como tutor e secretário de famílias aristocráticas, era monárquico e materialista, o que não raras vezes o colocou em sarilhos. Hobbes pressupõe que "bom" e "mau" são nomes que damos às coisas de que gostamos ou de que não gostamos. Assim, quando tu e eu gostamos de coisas diferentes, é por considerarmos boas ou más coisas diferentes. Contudo, Hobbes disse que este é um traço fundamental da nossa psicologia. Somos basicamente criaturas egoístas que querem viver tão bem quanto venha a ser possível. Isto é a chave para entender a ética. A ética surge quando as pessoas compreendem o que hão-de fazer para viver bem.

Hobbes refere que cada um de nós vive incomensuravelmente melhor se viver num sistema de cooperação social em vez de viver por conta própria. Os benefícios da vida social vão além da camaradagem. A cooperação social torna possível a existência de escolas, hospitais e auto-estradas; casas com electricidade e aquecimento central; aviões e telefones, jornais e livros; filmes, ópera e bingo; ciência e agricultura. Sem a cooperação social perderíamos tudo isso. Assim, é vantajoso para cada um nós fazer o que é necessário para estabelecer e manter a sociedade cooperativa.

Mas parece que uma sociedade mutuamente cooperativa só pode existir se adoptarmos certas regras de comportamento — regras que exigem que se diga a verdade, que cumpramos as nossas promessas, que respeitemos a vida e a propriedade dos outros, e assim por diante:

- Sem o pressuposto de que as pessoas falam a verdade, não haveria razão para as pessoas prestarem atenção ao que os outros dizem. A comunicação seria impossível. E sem comunicação entre os seus membros, a sociedade entraria em colapso.

- Sem a exigência de as pessoas cumprirem as suas promessas, não poderia haver divisão do trabalho — os trabalhadores não acreditariam que seriam pagos, os distribuidores não poderiam confiar nos acordos com os fornecedores, e assim por diante — e a economia entraria em colapso. Não haveria comércio, construção civil, agricultura, ou medicina.

- Sem a protecção contra assaltos, homicídios e roubos, ninguém se sentiria seguro. Todos estariam em alerta constante relativamente aos outros, e a cooperação social seria impossível.

Assim, para obter os benefícios da vida social, temos de celebrar um contrato uns com os outros, em que cada um de nós concorda em obedecer às regras que este estabelece, desde que os outros também o façam. Este "contrato social" é a base da moralidade. Logo, a moralidade pode ser entendida como o conjunto de regras que pessoas racionais consentem em obedecer, para seu benefício mútuo, desde que as outras pessoas também o façam. (...)»

James Rachels, in “Problems from Philosophy”

O despertar das civilizações

Excelente, esta série de documentários australianos sobre a pré-história e a formação das primeiras sociedades organizadas. Histórias da Idade da Pedra. Em três partes:



Os livros e a realidade

«(...) Como toda a gente, só disponho de três meios para avaliar a existência humana: o estudo de nós próprios, o mais difícil e o mais perigoso, mas também o mais fecundo dos métodos; a observação dos homens, que na maior parte dos casos fazem tudo para nos esconder os seus segredos ou para nos convencer de que os têm; os livros, com os erros particulares de perspectiva que nascem entre as suas linhas. 

Li quase tudo quanto os nossos historiadores, os nossos poetas e mesmo os nossos narradores escreveram, apesar de estes últimos serem considerados frívolos, e devo-lhes talvez mais informações do que as que recebi das situações bastante variadas da minha própria vida. A palavra escrita ensinou-me a escutar a voz humana, assim como as grandes atitudes imóveis das estátuas me ensinaram a apreciar os gestos. Em contrapartida, e posteriormente, a vida fez-me compreender os livros.

Mas estes mentem, mesmo os mais sinceros. Os menos hábeis, por falta de palavras e de frases onde possam abrangê-la, traçam da vida uma imagem trivial e pobre; alguns, como Lucano, tornam-na mais pesada e obstruída com uma solenidade que ela não tem. Outros, pelo contrário, como Petrónio, aligeiram-na, fazem dela uma bola saltitante e vazia, fácil de receber e de atirar num universo sem peso. Os poetas transportam-nos a um mundo mais vasto ou mais belo, mais ardente ou mais doce que este que nos é dado, por isso mesmo diferente e praticamente quase inabitável. Os filósofos, para poderem estudar a realidade pura, submetem-na quase às mesmas transformações a que o fogo ou o pilão submetem os corpos: coisa alguma de um ser ou de um facto, tal como nós o conhecemos, parece subsistir nesses cristais ou nessas cinzas. Os historiadores apresentam-nos, do passado, sistemas excessivamente completos, séries de causas e efeitos exactos e claros de mais para terem sido alguma vez inteiramente verdadeiros; dispõem de novo esta dócil matéria morta, e eu sei que Alexandre escapará sempre mesmo a Plutarco. Os narradores, os autores de fábulas milésias, não fazem mais, como os carniceiros, que pendurar no açougue pequenos bocados de carne apreciados pelas moscas. Adaptar-me-ia muito mal a um mundo sem livros; mas a realidade não está lá, porque eles a não contêm inteira. (...)»


Marguerite Yourcenar, in "Memórias de Adriano"

Grandes leituras

Uma farturinha do melhor jornalismo de sempre, numa lista de ensaios e reportagens de revistas. Por aqui anda gente como John Updike, Norman Mailer, Hannah Arendt, Susan Sontag, Hunter S. Thompson ou Tom Wolfe. Imperdível: Cool Tools: The Best Magazine Articles Ever

O Hubble

Os nativos do digital

As novas gerações já nascem e crescem num ambiente de omni-presença da informática e do online. Para os jovens, nunca houve outra coisa e um computador é tão natural como respirar. Para muitos isso é assustador, para outros, como eu, não é motivo para dramatismo, é bom e é mau, abre um mundo de problemas mas também de possibilidades. Tal como a vida antes do digital. Os problemas e as possibilidades são apenas diferentes.

A melhor estratégia perante isto, sobretudo para pais e educadores - é um absurdo, já agora, que esta nova e incontornável realidade ainda não tenha chegado em força às escolas e que a par com a difusão da tecnologia (Magalhães e afins) não existam já disciplinas de cidadania digital, segurança na web ou simplesmente de introdução à internet - é, desde já, perceber do que estamos a falar quando falamos de cultura digital. Este artigo ajuda: Understanding the Digital Natives | Monday Note

A web tem memória de elefante

Desafios do novo mundo digital e um sério alerta para aqueles que colocam online tudo e mais alguma coisa da sua vida privada. E um aviso para os pais e educadores começarem desde cedo a sensibilizar as crianças e os jovens para esta realidade: tudo o que vai para a net, fica na net e pode ter consequências sérias no futuro. Um excerto e um link:

«(...) In a recent book, “Delete: The Virtue of Forgetting in the Digital Age,” the cyberscholar Viktor Mayer-Schönberger cites Stacy Snyder’s case as a reminder of the importance of “societal forgetting.” By “erasing external memories,” he says in the book, “our society accepts that human beings evolve over time, that we have the capacity to learn from past experiences and adjust our behavior.” In traditional societies, where missteps are observed but not necessarily recorded, the limits of human memory ensure that people’s sins are eventually forgotten. By contrast, Mayer-Schönberger notes, a society in which everything is recorded “will forever tether us to all our past actions, making it impossible, in practice, to escape them.” He concludes that “without some form of forgetting, forgiving becomes a difficult undertaking.”

It’s often said that we live in a permissive era, one with infinite second chances. But the truth is that for a great many people, the permanent memory bank of the Web increasingly means there are no second chances — no opportunities to escape a scarlet letter in your digital past. Now the worst thing you’ve done is often the first thing everyone knows about you. (...)»


The Web Means the End of Forgetting - NYTimes.com

Prince Zeppelin

As redes sociais e a privacidade

Sou um adepto ferrenho da web e das redes sociais, mas não ignoro que toda esta avalanche de novidade também arrasta problemas. E não são poucos nem ligeiros - nem são, na sua essência, muito diferentes dos problemas de sempre, simplesmente ampliados pela tecnologia e pela rede. Daí a necessidade urgente de trazer para a ribalta (e para as escolas, rapidamente e em força) a educação para uma cidadania informática. Este post coloca questões pertinentes: A aba de Heisenberg - Privacidade, onde estás?

A minha esquina

Uns instantes de lucidez

Por entre a cacofonia fadista da desgraça e do bota-abaixo, que abunda em tudo o que é opinião publica acerca do estado da nação e do mundo, é uma lufada da ar fresco, ouvir gente como Mário Soares no último Prós e Contras, a olhar para o futuro com inteligência e optimismo; ou gente como estes dois empresários portugueses, Gonçalo Quadros, da Critical Software, e Nuno Arantes de Oliveira, da Alfama, que além de sacudir o pessimismo, introduzem um intervalo de lucidez neste filme trágico de mau gosto intitulado "a crise". Se o futuro de Portugal passa por empreendedores com a qualidade destes dois, há motivos para sorrir:

David Byrne, a música e a arquitetura

Os poderes secretos do tempo

As polaróides de Tarkovsky

Poemas del río Wang: Tarkovsky's Polaroids / Las Polaroid de Tarkovsky

Stephen Pinker, os novos média e o desenvolvimento humano

«NEW forms of media have always caused moral panics: the printing press, newspapers, paperbacks and television were all once denounced as threats to their consumers’ brainpower and moral fiber.

So too with electronic technologies. PowerPoint, we’re told, is reducing discourse to bullet points. Search engines lower our intelligence, encouraging us to skim on the surface of knowledge rather than dive to its depths. Twitter is shrinking our attention spans.

But such panics often fail basic reality checks. When comic books were accused of turning juveniles into delinquents in the 1950s, crime was falling to record lows, just as the denunciations of video games in the 1990s coincided with the great American crime decline. The decades of television, transistor radios and rock videos were also decades in which I.Q. scores rose continuously.

For a reality check today, take the state of science, which demands high levels of brainwork and is measured by clear benchmarks of discovery. These days scientists are never far from their e-mail, rarely touch paper and cannot lecture without PowerPoint. If electronic media were hazardous to intelligence, the quality of science would be plummeting. Yet discoveries are multiplying like fruit flies, and progress is dizzying. Other activities in the life of the mind, like philosophy, history and cultural criticism, are likewise flourishing, as anyone who has lost a morning of work to the Web site Arts & Letters Daily can attest. (...)». Continua aqui: Op-Ed Contributor - Mind Over Mass Media - NYTimes.com

Young and Innocent. Um grande Hitchcock esquecido


Um dos últimos filmes que o mestre fez em Inglaterra. Disponível para download em domínio público, aqui: Young and Innocent (The Girl Was Young) : Edward Black : Free Download & Streaming : Internet Archive

Um livro importante. Ideias poderosas. De como o regresso de Deus está a mudar o mundo

«(...)The return of religion is bringing two big sets of problems. The first is the return of wars of religion. Did you ever think you would hear the phrase "wars of religion" again? It's something that we associate with the 17th century. The mid-17th century saw a determined attempt to drive religion out of politics. You basically saw, with the Treaty of Westphalia in 1648, the establishment of the modern state system on the principle that the prince could determine the religious worship of the people who lived in his territory: cuius regio, eius religio.

That was the beginning of the great secularization of foreign policy, which went on throughout the 19th century, which was dominated by the balance of power.

Throughout the 20th century, you saw the resurgence of various ideologies in foreign affairs, but they were political ideologies, not religious ideologies. Even a decade ago, nobody really took the return of religion very seriously. In Henry Kissinger's great masterpiece, Diplomacy, a 900-page-long book, the word "religion" does not appear at all in the index. Somebody did a study of the four most important American foreign policy journals between 1980 and 1999. There were a dozen articles about religion in that entire period.

There's a wonderful quote from Madeleine Albright when she was talking with a bunch of Clintonistas in the late 1990s about the Northern Ireland peace process. One of the Clintonistas says, "Can you believe that we are talking about a religious conflict at the end of the 20th century?"

Well, we are now at the beginning of the 21st century, and you can certainly believe that we are talking about religious conflict. The world is very much out of its Westphalian box.

Look at West Africa and Nigeria. You can see a potential conflict, a conflict between fundamentalist Islam and evangelical Christianity. Right along the 10th parallel, there are numerous potential wars or, indeed, real wars of religion going on. Many of the world's older and more intractable conflicts, such as the Palestine-Israeli conflict, are now getting an ever-harder religious edge. Whatever they were in the past, they are becoming real wars of religion.

As John was saying, by the mid-21st century, China could become the world's biggest Muslim country, as well as the world's biggest Christian country, which creates a huge potential for religious conflict and wars.

The problem, of course, with religion is that once it gets involved with politics, it makes things more difficult to deal with, partly because it solidifies loyalties, partly because it inflames passions. You can compromise over land eventually, but when it's a battle between truth versus truth, compromise is much, much more difficult. So wars of religion are coming back, and they are very, very difficult to deal with.

The second problem, of course, is the spread of American-style culture wars. Europeans have always looked at America and seen these culture wars as signs of, quite frankly, American derangement.

But these culture wars are now spreading to Europe and, indeed, to much of the rest of the world. Politics increasingly, in Europe and elsewhere, is being driven by questions of value, questions of identity, questions of the meaning of life. It's not just that old technocratic debate about who gets what and how we run an established welfare state.(...)». Está tudo aqui: God Is Back: How the Global Revival of Faith Is Changing the World

Massacres

Pois, de massacres sangrentos percebem os turcos. Que o digam os curdos e os arménios. Também achei graça à condenação do Kremlin, essa conhecida instituição de solidariedade universal. Que o digam os chechenos. Os da Liga das Ditaduras Árabes também têm uma legitimidade moral extraordinária. Enfim, tudo bons rapazes. Tal como os militantes do IHH, os do Hamas, os do Hezbollah, o Irão, os sírios, o Kadhafi, etc. Tudo boa gente. Pelo menos, reconheça-se, são talentosos na guerra da propaganda: PM turco acusa Israel de ter cometido um «massacre sangrento» - TSF

O Islão, ó que linda religião

Onde ficamos também a saber que nas Maldivas, esse paraíso balnear, é obrigatório ser-se muçulmano. A sério. Vem na Constituição. Qualquer outra forma de pensar dá direito a linchamento. Aliás, qualquer forma de pensar. Como explica o "scholar" muçulmano do artigo, "The problem with you is that you are extra-smart. Being smart is good, [but] being extra-smart is not good": Haveeru Online - Maldivian renounces Islam, gets attacked by Zakir Naik audience

Fé em Tarvu

Alguns mandamentos do Tarvuismo:

* Tarvu is our Lord God
* There are two universes
* The Tarvunty is the Holy Book
* We should all "be nice"
* Men and women are equal (to each other)
* Tarvu's Prayer should be said every day
* Octopuses are holy creatures
* Everyone has an invisible guardian from Universe A.

Conheça aqui a religião para acabar com todas as religiões: Tarvuism - The official international internet website for the Tarvuist faith

Eric Schmidt e a sociedade digital

As Cores


I am a member of the council of the naval mutiny
And no traitor to my conscience having done my sworn duty
These are my last words before the scaffold
and I charge you all to hear
How a wretched British sailor became a citizen mutineer
Pressed into service to carry powder I was
loyal to the crack of the whip
If I starved on the streets of Bristol, I
starved worse on a British ship
Red is the colour of the new republic
Blue is the colour of the sea
White is the colour of my innocence
Not surrender to your mercy
I was woken from my misery by the words of Thomas Paine
On my barren soil they fell like the sweetest drops of rain
Red is the colour of the new republic
Blue is the colour of the sea
White is the colour of my innocence

Not surrender to your mercy
So in the spring of the year we took the fleet
Every cask and cannon and compass sheet
And we flew a Jacobin flag to give us heart
While Pitt stood helpless we were waiting for Bonaparte
Red is the colour of the new republic
Blue is the colour of the sea
White is the colour of my innocence
Not surrender to your mercy
All you soldiers, all you sailors, all you labourers of the land
All you beggars, all you builders, all
you come here to watch me hang
To the masters we are the rabble, we are the 'swinish multitude'
But we can re-arrange the colours of the
red and the white and the blue
Red is the colour of the new republic
Blue is the colour of the sea
White is the colour of my innocence
Not surrender to your mercy
Red is the colour of the new republic
Blue is the colour of the sea
White is the colour of my innocence
Not surrender to your mercy

The Men They Couldn't Hang

A internet e a felicidade

Navegar é preciso. Senão vejamos: «When it comes to mental health, the Internet gets a bad rap. There are countless studies that suggest regular access to the Internet is linked to stress, anxiety and addiction. But before you stop tweeting and toss out your iPhone, it turns out that spending time on the Web could actually be making you happier.(...)»: Internet Use Makes Us Happier, Says Mental-Health Study - TIME

Problemas

Lista de questões filosófica mal resolvidas: List of unsolved problems in philosophy - Wikipedia, the free encyclopedia

Política à inglesa

Como ainda somos uma democracia imberbe, talvez daqui a cem anos consigamos ter algo como os "Lib Dems" no nosso panorama político. Até lá, temos um deserto liberal à direita que ninguém preenche e que engrossa o deserto nas urnas. Na Grã Bretanha, por outro lado, é assim: Freedom, Fairness, Responsibility. - 31 da Armada

A morte de um bardo

E um olhar muito interessante sobre o neo-paganismo, uma espécie de mistura de nostalgia da Idade Média (ou, pelo menos, de uma certa Idade Média...) e da antiguidade pré-cristã europeia com panteismo, e uma expressão religiosa multifacetada, como todas as expressões religiosas, de resto, que reúne cada vez mais adeptos - não há nenhum recenseamento rigoroso, como é evidente, mas algumas fontes apontam para mais de três milhões de adeptos no mundo e a crescer, sobretudo congregados na sub-cultura Wiccan.

Mas vale a pena é ler o texto: Hrafspa ; Killing the Buddha

a foto vem daqui

Droga de guerra

«After 40 years, the United States' war on drugs has cost $1 trillion and hundreds of thousands of lives, and for what? Drug use is rampant and violence even more brutal and widespread.». Sendo que, ao contrário, a abordagem legal e criminal portuguesa é apontada internacionalmente como exemplar: The Associated Press: AP IMPACT: US drug war has met none of its goals

O poder de atracção da barbárie

Como não combater esta indignidade que se espalha disfarçada de religião? Mais uma excelente reportagem BBC. No Paquistão com os Talibans: BBC - BBC World Service Programmes - Assignment , A Taliban Class War?

A arte da confirmação

Para quem tem dúvidas em relação à excelência do jornalismo norte-americano (pelo menos o dos média de referência, esqueça-se a abominável Fox News), ou para quem não saiba porque é que este é excelente, aqui está um artigo da New Yorker, imperdivel para qualquer estudante ou professor de jornalismo. Trata dos "fact checkers", jornalistas e editores especializados apenas em confirmação (e reconfirmação) de factos. Todos os artigos publicados passam pelo crivo de equipas de "revisores de investigação": checkpoints.pdf (Objecto application/pdf)

Isto é um debate

A sugestão de Daniel Oliveira na sua última (excelente) crónica no Expresso, mostra o que é um verdadeiro debate. Em contraste com a última e vergonhosa edição do Prós e Contras na nossa televisão pública (um hino afinado de louvor à Igreja Católica disfarçado de debate e de jornalismo). Ora, isto que se segue nesta série de 13 vídeos, É um Debate; o que por aqui em Portugal se faz, quando toca ao tema religioso, é indigência mental e pensamento único:

A crise moral

«(…) Apesar desse seu diagnóstico todos os dias ouvimos dizer que a nossa sociedade é, cada vez mais, uma sociedade sem valores, como é que ...